A Medida Provisória (MP) 927/2020, que flexibiliza regras trabalhistas durante a pandemia do novo coronavírus, corre o risco de caducar. O imbróglio aconteceu no Senado, onde o relator da MP – o senador Irajá (PSD-TO) – propôs estender até o fim do ano a suspensão do recolhimento do FGTS e do INSS por parte das empresas, além do salário-educação. Não houve acordo para votar o texto no plenário na semana passada. E a medida provisória tem validade só até o próximo domingo (19).
Os líderes do Senado deveriam ter se reunido na segunda-feira (13) para decidir a pauta da semana, o que não aconteceu. Ainda não há data para retomar a votação da MP que muda as regras trabalhistas. O projeto não entrou em pauta da Casa desta terça (14).
Mesmo que haja acordo para pautar o texto na quarta ou na quinta, o prazo será bastante apertado: caso o plenário aprove qualquer mudança de conteúdo na MP vinda da Câmara, o texto terá de voltar para apreciação dos deputados.
A medida foi editada pelo governo em março e em meados de junho foi aprovada pela Câmara. Faltava apenas o aval do Senado. Mas o governo e parte dos senadores foram surpreendidos com o relatório de Irajá, que mudou pontos considerados cruciais pela equipe econômica, desagradando a equipe do ministro Paulo Guedes e aliados.
“Irajá quer dar alívio de caixa a empresas até dezembro; governo teme pelo INSS e FGTS”
Irajá propôs que as empresas fiquem sem recolher para o INSS, FGTS e salário-educação enquanto durar o estado de calamidade pública – ou seja, até 31 de dezembro. O recolhimento voltaria ao normal partir de janeiro de 2021 e o débito de 2020 poderia ser quitado em 12 vezes, também a partir de janeiro.
O texto original da MP, editado pelo governo e depois aprovado pela Câmara, previa o diferimento do pagamento do FGTS, mas num prazo bem menor. Uma portaria, também do governo, também diferiu o recolhimento para o INSS, mas por pouco tempo. O recolhimento para Previdência foi suspenso por dois meses. Já o do FGTS foi paralisado por dois meses. Em ambos os casos, o recolhimento voltou ao normal agora em julho e as empresas devem quitar os débitos até o fim deste ano.
Com isso, tanto a Previdência quanto o FGTS não ficariam tanto tempo sem o recolhimento de recursos. Ambos precisam de aportes mensais: no caso do INSS, para ficar menos deficitário. E do FGTS, para continuar sustentável. Só com o diferimento no primeiro semestre, o INSS deixou de arrecadar R$ 33,4 bilhões e o FGTS, R$ 11 bilhões, valores que deveriam ser quitados agora no segundo semestre.
Já pela proposta do senador Irajá, o diferimento ficará ainda maior e só será quitado a partir de 2021. O parlamentar defende a sua ideia. Ele alega que a pandemia está se prolongando mais do que o esperado e os três meses de diferimento foram pouco. “É mais um fôlego para as empresas em dificuldades. Não se trata de uma isenção. Estamos falando de prazos para pagamento e redução de encargos e juros totalmente descabidos em tempos de pandemia”, disse na sessão do Senado da última quinta-feira (9).
A equipe econômica é contra. A sustentabilidade do FGTS tem sido uma grande preocupação do time do ministro Paulo Guedes, já que estão em vigor o saque-aniversário e o saque emergencial. Há um temor no governo pelo aumento das demissões sem justa causa (que dão direito ao saque total). O dinheiro do fundo financia diversos projetos, como de habitação. No caso da Previdência, o INSS já é deficitário, e atrasos no recolhimento só aumentam o rombo.
Semana passada, não houve acordo para votação
Uma sessão foi convocada na quinta-feira passada (9) para votar a MP. A votação, contudo, nem foi iniciada, pois não houve acordo durante a sessão do plenário virtual do Senado. Senadores de diferentes partidos se manifestaram a favor do adiamento, diante das mudanças significativas feitas pelo relator.
“Nós teremos mais tempo para negociar melhor, para retirar alguma coisa que ainda esteja causando dúvida, desconfiança, que traga um mal-estar como foi manifestado aqui, alguns chamando de jabuti”, disse o senador Marcelo Castro (MDB-PI). “O senador Irajá é um grande articulador, um senador competente, conciliador, e nós esperamos que na próxima semana, então, depois de intensas negociações, nós possamos votar essa matéria”, completou.
Caducar pode ser opção melhor para o governo
Os líderes se manifestaram a favor de levar o tema para votação nesta semana. Mas, caso haja chances de derrota, para o governo é melhor que a medida caduque. Assim, prevalecem os prazos escolhidos pelo governo e as empresas seguem recolhendo normalmente neste segundo semestre e tendo que pagar suas dívidas.
O que diz a MP original das regras trabalhistas
Apesar do imbróglio criado em cima da suspensão do recolhimento do INSS, FGTS e salário-educação, o ponto principal da MP nem é esse. Mas sim uma das mudanças nas regras trabalhistas: a permissão para que empregador e empregado celebrem acordos individuais ou coletivos durante o estado de calamidade pública para flexibilizar regras trabalhistas.
O objetivo da MP é facilitar acordos para:
– adoção do teletrabalho;
– antecipação de férias individuais;
– concessão de férias coletivas;
– o aproveitamento e antecipação de feriados; e
– a compensação do banco de horas.
Os acordos só são válidos durante a pandemia. Todos esses pontos foram aprovados pela Câmara. Os deputados apenas acrescentaram a permissão para antecipar feriados religiosos, algo que não estava no texto do governo. E retornaram com o artigo que permite a suspensão do curso ou programa de qualificação profissional durante a pandemia ou a sua oferta em modalidade à distância.”
Fonte: Gazeta do Povo