Ministro Gilmar Mendes decide que ações trabalhistas podem tramitar mesmo sem decisão do STF sobre índice de correção monetária Foto: Jorge William / Jorge William/27-09-2019
Processos haviam sido suspensos até que a Corte decidisse o índice. Ministro determina que, havendo impasse, deve ser usada a TR (Por Eliane Oliveira e Camila Pontes)
O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu, na última quarta-feira, que as ações relacionadas ao índice de correção de dívidas trabalhistas podem continuar a tramitar até que o plenário da Corte decida o que será aplicado: a Taxa Referencial (TR) ou o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E).
Segundo a decisão do ministro, até que saia um posicionamento definitivo do STF, se houver controvérsia, a correção será feita pela TR. Teoricamente, a TR por ter estado muita baixa ou mesmo zerada beneficia os empregadores, enquanto o IPCA-E é favorável aos trabalhadores
A correção dos valores é pedida nas ações judiciais que cobram o pagamento de férias, FGTS, 13 salário, horas extras, entre outros.Estima-se que existam cerca de 3,5 milhões de ações na Justiça do Trabalho, das quais 2,5 milhões em fase final de execução.
Apesar do elevado volume de ações judiciais, Gilmar Mendes esclareceu que sua decisão não vai impedir o andamento de processos judiciais, “tampouco a produção de atos de execução, adjudicação e transferência patrimonial no que diz respeito à parcela do valor das condenações que se afigura incontroversa pela aplicação de qualquer dos dois índices de correção”.
No sábado passado, Gilmar Mendes havia concedido uma liminar suspendendo o andamento de todas as ações envolvendo os dois indexadores. A decisão foi resposta a ação movida por entidades de classe, como as confederações nacionais do Sistema Financeiro (Consif) e da Tecnologia da Informação e Comunicação (Contic). Segundo o ministro, a escolha do índice de correção de débitos trabalhistas ganha ainda mais importância, visando à garantia do princípio da segurança jurídica.
Para a presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Maria Cristina Peduzzi, a nova decisão de Gilmar Mendes é bastante clara: não haverá suspensão de processos em execução de sentença, e o juiz determinará o levantamento do valor principal atualizado (juros de 1% ao mês e correção monetária pela TR). Assim, eventuais diferenças resultantes de aplicação do IPCA-E serão pagas posteriormente.
— A controvérsia sobre eventuais valores no resultado da diferença entre a aplicação da TR e do IPCA-E é que deverá aguardar o pronunciamento final da Corte, quando do julgamento do mérito — disse, acrescentando que há decisões precedentes do TST determinando que a definição do índice seja remetida à fase de liquidação/execução de sentença.
Noemia Porto, presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), criticou a decisão que, a seu ver, “revela um déficit democrático invertido, ou seja, tenta-se impor uma decisão pouco debatida, e até mesmo contrária aos consensos que estavam sendo firmados”. Em sua opinião, o ministro quis impor a TR apenas para os créditos trabalhistas, sem debate colegiado, contrariando o entendimento do próprio STF e da maioria absoluta do TST, às vésperas do recesso.
— É como se os créditos trabalhistas fossem uma subclasse. E o preço que impôs para fazer prevalecer a sua convicção foi a insegurança jurídica na paralisação dos milhões de processos, quando o esforço do próprio CNJ (Conselho Nacional de Justiça), em meio à pandemia, era de uma justiça que não para. O que se espera agora neste ambiente inusitado de uma decisão proferida, mantida, mas dita modificada, é que rapidamente o plenário do STF possa não referendar essa prática— disse a presidente da Anamatra.
O advogado trabalhista Flavio Aldred Ramacciotti, sócio do escritório Chediak, Lopes da Costa, Cristofaro, Simões Advogados, também espera agilidade na decisão final.
— Esse processo deve ir para a pauta do Supremo assim que a corte voltar do recesso, porque estamos em um “balaio de gato”. Cada turma (dos tribunais) interpreta de um jeito. Essa não é a primeira vez que ocorre a suspensão das ações — afirmou.
A advogada trabalhista Aline Fidelis, sócia do escritório Tauil & Chequer Advogados, reforça a tese de que para não haver prejuízo ao empregado, a indenização pode ser calculada com base na TR e, se ficar decidido que o índice deve ser o IPCA-E, os valores são recalculados.
— No sábado, pensamos pensou-se que 90% dos processos trabalhistas iriam parar, porque a maioria discute qual o índice a ser aplicado na indenização. Mas após o embargo da declaração da Procuradoria Geral da República (PGR), o ministro Gilmar Mendes esclareceu que não tem que parar todas as ações — explicou a advogada.
Entre os motivos alegados pelo ministro para suspender o andamento das ações estavam a crise decorrente do estado de calamidade pública, decretado em razão da pandemia da Covid-19; a iminência de um posicionamento sobre o assunto (TST) para suspender o atual índice (a TR); e o início do recesso do Judiciário.
Fonte: O Globo