Os fundos de pensão foram pegos no contrapé pela pandemia do coronavírus. Com um patrimônio equivalente a 13% do Produto Interno Bruto (PIB) e pagamentos anuais de R$ 60 bilhões aos participantes, eles vinham reduzindo de forma significante seus déficits, que, no agregado, passaram de R$ 76 milhões em 2015 para R$ R$ 26 milhões no ano passado. Com a queda na Bolsa decorrente da pandemia – o Ibovespa recuou 26% no acumulado do ano -–, no entanto, o sinal de alerta se acendeu e alguns voltaram a verificar resultados negativos.
Maior fundo de pensão do País, o Previ, dos funcionários do Banco do Brasil, teve retorno negativo de 12,4% em um de seus planos no primeiro trimestre, com déficit de R$ 23,6 bilhões. Em entrevista recente ao Estadão, o diretor de investimentos do fundo, Marcelo Wagner, admitiu a possibilidade de fechar o ano sem bater a meta de rentabilidade. “É possível que isso aconteça com todo o segmento (de fundos de pensão)”, disse.
No Postalis, dos funcionários dos Correios, um dos dois planos de previdência não conseguiu bater a meta de rentabilidade nos quatro primeiros meses do ano. Nesse período, o plano deveria ter apresentado rentabilidade de 1,85%, mas o número ficou em -2,4%.
O diretor de investimentos do fundo, Alexandre Miguel, destaca, porém, que “não está no radar” ficar aquém da meta anual. “Março foi traumático para quem está na Bolsa, mas, se houver uma estabilização nesse cenário de notícias mais animadoras vindas do exterior, com a economia reabrindo, nossos dois planos devem bater a meta.”
Na Petros, dos empregados da Petrobrás, os três maiores planos registraram a pior rentabilidade do setor no primeiro trimestre, entre -13,3% e -15,3%. A meta variava de 1,61% a 1,83%. Em nota, o fundo afirmou que fez mudanças em seu portfólio nos meses seguintes e que deve conseguir superar as metas em abril e maio. Destacou ainda que Petros esclarece que “investimentos de planos de previdência devem ser observados sob a ótica de longo prazo. Por isso, ainda é cedo para falar sobre a rentabilidade do fim do ano e o resultado dos planos”.
Se déficit não for revertido, participantes podem ter de fazer aporte extra
Se não revertidos, os déficits podem fazer com que alguns planos tenham de exigir aportes extras de seus participantes, como ocorreu com frequência nos anos 2010. O presidente da Associação Nacional dos Participantes de Fundos de Pensão e dos Beneficiários de Saúde Suplementar de Autogestão (Anapar), Antonio Bráulio de Carvalho, afirma estar preparando algumas propostas para levar ao governo.
Na modalidade de benefício definido, em que o valor a ser recebido pelo aposentado é estabelecido em regulamento, a sugestão é que, se houver a necessidade de um plano para equacionar o déficit, ele seja aplicado apenas em 2023. Pela lei, os fundos têm de fazer esse ajuste anualmente para assegurar o valor do benefício. Nesses casos, os trabalhadores na ativa precisam contribuir com valores mais elevados e o benefício dos aposentados reduz.
“Muitos contribuintes ainda estão pagando contribuições extras de anos anteriores (para compensar prejuízos passados). Então, excepcionalmente, estamos pedindo para que os resultados de 2019, 2020 e 2021 sejam aplicados apenas em 2023.”
Na modalidade de contribuição definida, em que as cotas são corrigidas mensalmente e o valor a receber no futuro dependente do montante acumulado, a proposta é aplicar apenas 50% do prejuízo agora. O restante seria aplicado apenas quando a economia voltasse a se recuperar. Nessa modalidade, os ajustes podem afetar os aposentados, que teriam seus benefícios reduzidos. As propostas serão apresentadas à Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc) e ao Conselho Nacional de Previdência Complementar (CNPC).
Segundo o superintendente da Previc, Lucio Rodrigues Capelletto, os impactos da pandemia foram “significativos” nos fundos de pensão, mas todos têm capacidade para pagar as obrigações nos próximos 18 meses. “Se vai ter déficit no fim do ano, não sei. Tudo dependerá da recuperação econômica. Já houve recuperação em abril e maio”, destacou.
Para Luis Ricardo Martins, da Abrapp, também é cedo para falar em equacionamento. “É preciso lembrar que estamos vivendo uma crise conjuntural. Em crises anteriores, a recuperação foi rápida. Na do subprime (2008), por exemplo, a recuperação ocorreu já em 2009, quando os fundos obtiveram uma rentabilidade equivalente ao dobro da necessidade atuarial.” Ele destaca que instalou um grupo de trabalho para avaliar a possibilidade de adoção de regras conjunturais para travessia da crise, evitando aportes adicionais.
Fonte: Estadão